sábado, 9 de agosto de 2008

A última casa de ópio


Não vou compor aqui uma rapsódia ao ópio. Mas direi o seguinte: é a droga perfeita. Não existe nada parecido. Nesta era de empurroterapia farmacêutica, ele proporciona tudo o que drogas como o Prozac prometem. Esqueça a fixação medieval pela serotonina, as atrocidades de Freud, os “distúrbios” iatrogenicos que compõem a Malleus Maleficarum com o qual os analistas e psicofarmacêuticos de hoje em dia iludem seus alvos vulneráveis. Todos os comprimidos e toda prostituição da psicoterapia do mundo não são nada comparados com as ancestrais palavras coptas do Evangelho de Tomé: “Se trazes à tona o que está dentro de ti, o que trazes à tona te salva. Se não trazes à tona o que está dentro de ti, o que não trazes à tona te destrói". É simples e indecifrável assim. Esqueça a interação dele com a serotonina. O que vale é a interação dele com a sabedoria do Evangelho de Tomé. Seus vapores pertencem ao que você tem dentro.
Acredito que é por isso que este, o mais delicadamente delicioso dos tóxicos, a menos entorpecente das drogas – menos até que a maconha – seja, apesar disso, tão viciante. Como o sabor do paraíso poderia não o ser? Sim, claro, seria bem melhor sentir esse sabor por meio do entendimento e da vida. Mas, por mais terrível que seja a dependência terminal de ópio, não é mais terrível do queoutras dependências mais familiares e aceitáveis. Viciados em ópio podem viver bem até a velhice; e ser dependente do paraíso, por mais artificial que seja, pode ser considerado mais ignóbil do que ser dependente da televisão, do cinema, ou das outras artificialidades rasteiras de um mundo tão vazio a ponto de ter consciência e entendimento da pseudociência da serotonina, mas não da sabedoria de Tomé? Um mundo tão vazio a ponto de se enamorar pelo falso conhecimento do suco de uva azedo, mas não pelo verdadeiro conhecimento de algo como ópio, para não falar da vida em si?
Mas chega dessa profundidade. O trabalho que sua elucidação envolve é grande demais. Você quer iluminação? Vá atrás dela você mesmo. De qualquer forma, como eu disse – ou foi um daqueles outros caras? – o paraíso não tem palavras.
Nick Toshes em seu A Última Casa de Ópio.

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