terça-feira, 25 de novembro de 2008

Um homem rico


Um homem queria ficar rico e, todos os dias, ia pedir a Deus que lhe atendesse às súplicas.
Num dia de inverno, ao voltar da oração, avistou, presa no gelo do caminho, uma polpuda carteira de dinheiro.
No mesmo instante, julgou-se atendido. Mas como a carteira resistisse aos seus esforços, urinou em cima dela a fim de derreter o gelo que a retinha. E foi então...
Que despertou na cama toda molhada...

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Retorno do Cap. Kirk - Prólogo.


linda ilustração de Daniel Pingú

Ele caía...
Sozinho.
Atravessando o ar de Veridian III. A estridência da ponte de metal ecoando em seus
ouvidos. Rodopiando. 0 sol reluzindo em seus olhos. As sombras envolvendo-o por completo.
Uma atrás da outra, à medida que ia caindo. Luz Sombra. Luz. Sombra. Como um bater de
asas. Como todos os dias de sua vida. Entrecruzando-se...
Num campo de milho no Iowa... ele olha as estrelas. Um menino de cinco anos nos braços de seu pai. Eu tenho de ir até lá, diz o menino. E você vai, Jimmy, responde o pai. Você vai...
Nos braços de Carol, na cama de casal... mesmo sabendo que devia deixá-la, assim como o filho que conceberam e que crescia dentro dela...
No quartel general da Frota Estelar... o almirante Nogura aperta sua mão: Parabéns, capitão, a Enterprise é sua...
Na doca espacial... o capitão Pike fazendo a apresentação: Seu oficial de ciências, tenente-comandante Spock...
Nas ruas do passado da Terra... a freada brusca, Edith, iluminada pelas faróis que penunciavam a morte...
Ao longo de todos aqueles dias, ele caindo, sozinho, ouvindo os sussurros do passado...
Eu sou e sempre serei seu amigo... Droga, Jim, sou um médico, não um pedreiro...
Deixe-me ajudar...
Eu sempre soube que morrerei sozinho...
Então, uma sombra bloqueou a luz. Deteve sua queda. Interrompeu aquele caleidoscópio de dias. Ele virou a cabeça, olhou para cima, viu um rosto que reconhecia, não do passado, nem do presente.
Do futuro.
- Conseguimos? - por fim, perguntou. - Nós fizemos a diferença?
O outro, em seu estranho uniforme, mas com a familiar insígnia da Frota Estelar no peito, ajoelhou-se ao seu lado.
- Sim, nós fizemos a diferença. Obrigado.
Em seu interior, o homem caído estava ciente da dor profunda e incurável Em seu interior, conscientizou-se de que não podia sentir as pernas, os braços, como se ele e toda a existência estivessem se dissipando ao mesmo tempo.
Sua visão começou a desfocar, escurecer, engolfada por uma sombra final que absorveu tudo o mais que restava.
Mas o outro, esse estranho, esse... Picard.. ofereceu sua amizade Em uma outra existência, talvez fosse possível. Muitas coisas teriam sido possíveis. Tantas possibilidades...
- E o mínimo que eu podia fazer - disse o homem caído, ignorando aquela sombra final
por causa de seu novo amigo -pelo capitão da Enterprise.
As vozes da escuridão começaram a chamá-lo novamente e, juntas, eram mais do que
apenas sussurros.
Através do entrelaçamento do metal retorcido, ele vislumbrou algo movendo-se, chegando mais perto.
Fechou os olhos.
O que havia dito a Picard quando se conheceram? Quando Picard o desafiou a voltar para realizar uma última missão?
Ele se lembrava. Então, seus olhos abriram-se.
- Foi... divertido - murmurou ele para Picard. E tentou sorrir. Para poupar a dor ao amigo.
Aquilo que surgira e que repousava além da ponte estava cada vez mais perto, vindo, como sempre estivem antes, em seu encalço.
Através do aço dilacerado, a forma estava mais clara agora. Mais próxima. Conhecida.
O olhar do homem caído a acompanhou, admirado por que Picard não a via, sequer pressentia sua presença.
Tentou alertar Picard Ajudá-lo a evitar algo do que já não mais podia fugir.
Mas o amálgama de seus dias chegara ao ápice. Rapidamente. E a face daquilo que o perseguia chamou definitivamente sua atenção.
Os resquícios finais de existência emanaram dele como uma luz suave e difusa, revelando tudo o que repousava além e que, ainda, estava por vir.
- Meu Deus! - murmurou.
Enquanto ainda via.
Enquanto ainda sabia.
E, aí, caiu novamente.
Sozinho...



Bill Shatner, quem diria...

por favor, não comam meu cerebro!


A midia age como um zumbi do romero. Coiotes e abutres atraídos pela podridão... podridão essa criada e recriada por ela mesma, irracional... Eles esperam a próxima tragédia do momento, tudo de forma muito grotesca, exploram os detalhes mais sórdidos, vão atrás das pequenezas que não interessariam a ninguém. Surpreendentemente mais casos surgem diariamente, como uma epidemia, aparecem em todos os lugares.
Motoristas drogados e surtados matam inocentes como um grupo de exterminio dos infernos. Crianças são lançadas de prédios por pais e madrastas, aparentemente possuídos pelo cão. Por todo Brazil, babás e empregadas sádicas e perversas cruekmente torturam crianças, idosos e deficientes mentais. Homens que aparentemente não sabem amar, enlouquecidos de ciúmes, sequestram, torturam e matam suas parceiras, por todo o país. Predadores sexuais, estupram, matam e espalham crianças mortas dentro de malas por aí. Professoras ora estão na mira de uma armas empunhada por uma criança, ora são acusadas e condenadas por incitar um espancamento entre crianças de 6 anos.
O pior, pra mim, é esperar a próxima miséria humana do momento. O que está sorrateiramente escondido bem perto de mim? Qual a intensidade da próxima bomba que irá explodir? Enquanto isto vivemos em estado de constante tensão. Um mundo muito mais assustador que aqueles habitados por zumbis que só querem comer a gente.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

os negros e o negro


A zeladora do prédio onde moro é negra. (Ela usa um lindo boné africano.)
O zelador do prédio em frente e do prédio ao lado são negros. (O do bloco da frente vive de tererê.)
O zelador do prédio onde morei antes era negro.
Negros também eram três dos cinco zeladores que instalavam a decoração de Natal num dos prédios mais caros do Sudoeste, ontem pela manhã.
Negras as duas mulheres e as duas crianças de colo que ontem pela manhã pediam "uma moeda, tia", no estacionamento da feira permanente do Cruzeiro.
São negros cinco dos sete adolescentes que dormem na calçada do Box 16, na entrada da Feira dos Importados.
Nos meus tantos anos de vida escolar, não tive nenhum professor negro.
Nos meus 30 anos de redaçaõ, convivi com centenas de jornalistas. Só sete eram negros.
Não houve nem há nenhum negro entre os médicos com os quais eu e minha família nos consultamos. Não raramente, observo entre a classe média, gente que gagueja antes de dizer "negro", num preconceito que se manifesta às avessas. Caracterizar a coe da pele de alguém como sendo negra é, no entendimento dos gaguejantes, uma ofensa. Preferem "moreno", para disfarçar o sentido negativo que dão à diferença de cor da pele.
São essas algumas, e só algumas, das razões pelas quais esta brasileira aqui chorou desbragadamente na madrugada do histórico 5 de novembro passado.
O que o negro eleito fará com o cargo conquistado é algo a saber - e a torcer.
os céticos que me perdoem, mas a eleição de um negro à presidênciamais poderosa do mundo é um alento à alma dos negros de todo planeta. Raça (e digo raça no sentido cultural e não genético, antes que alguém me lembre que a ciência já provou que raça não existe), raça que foi e continua sendo extropiada, usurpada, tratada como subumana, com o pedão da palavra feia. O mundo inteiro sabia que o negro poderia ganhar do branco, mas parecia improvável demais para acreditar. A ficha não caiu antes da hora nem para o mais arguto e astuto dos analistas políticos dos grandes jornais e sites. O mundo sabia de antemão que ele poderia ganhar, mas era demais saber.
Na madrugada de 5 de novembro de 2008, a história imprimiu sua pegada grandiosa na era contemporânea. Só quando se viram as multidões nas ruas das principais cidades norte-americanas, o choro do reverendo Jesse Jackson, e de eleitores jovens de todas as cores, é que caiu a ficha do mundo. Um negro chegou lá. Independentemente do que ele vier a fazer, a vitória nas eleições por si só já foi uma inimaginável conquista. Tomara, não seja somente uma conquista simbólica.
Conceição Freitas escreve ótimas cronicas da cidade naquele jornalzinho de merda chamado correio braziliense.

12 anos


sexta-feira, 7 de novembro de 2008

As provas da conspiração


Rato Jerry é pró-judeu, conclui especialista do Ministério da Educação do Irã. Para Hassan Bolkhari, especialista em comunicação de massa, o desenho animado Tom e Jerry é uma conspiração para favorecer a imagem dos ratos - apelido pejorativo associado aos judeus. Folha Mundo, 25 de fevereiro de 2006.
Confrontado com a esmagadora evidência de sua culpa, Jerry, o rato, não teve outro remédio senão admitir a verdade: sim, disse ele, eu não passo de um agente secreto a serviço de uma conspiração criada para melhorar a imagem judaica no mundo.
Soluçando, disse que relutara muito antes de aceitar a proposta, mas que esta se tornara irrecusável quando lhe foi feita uma inesperada oferta: pelo resto de sua vida teria queijo na quantidade que quisesse.Ah, sim, e poderia escolher a variedade: brie, camembert, cream cheese, feta, gorgonzola, gruyère, mussarela, pecorino, provolone, roquefort, qualquer uma destas variedades estaria à sua disposição (acompanhada ou não de bolachinhas e torradas), bastando apenas que ele telefonasse e dissesse sua senha. Encontraria o queijo em certa secreta despensa, que aliás serviria de base de operações para outros ratos famosos envolvidos na conspiração. E que eram muitos: por exemplo, o camundongo Mickey e sua namorada, Minnie: como Jerry, figuras simpáticas, amáveis. Mas devidamente cooptadas.
Mas as revelações não ficaram por aí. Descobriu-se que Tom, o próprio Tom, o gato valoroso que perseguira Jerry em tantos desenhos animados, também estava sob o controle dos mentores da conspiração, coisa que demandara várias providências. Capturado, Tom fora submetido a uma lavagem cerebral, da qual saíra com característicos de autômato. Nos desenhos animados, ele poderia continuar correndo atrás de Jerry, mas sem jamais alcançá-lo. Com isso, estaria confirmando a superioridade dos ratos (e do grupo que eles metaforicamente representam). Tom seria vigiado de perto pelo enorme cão que existia na casa e que também era parte da conspiração.
Enfim, a revelação chocou muita gente. Mas ela deve servir de alerta. Será que outras figuras dos desenhos animados não estão envolvidas na conspiração? Será que o Pato Donald não está nessa? Ou a Branca de Neve? Ou o Bob Esponja? O inimigo é insidioso e está por toda a parte. É melhor, portanto, não ir ao cinema, não assistir à TV, não ler livros, revistas ou jornais. Ah, sim, e não esqueçam de olhar debaixo da cama: será que o Jerry não está ali, escondido, à espera do momento propício para atacar?

Moacyr Scliar... meu imortal vivo preferido...

quinta-feira, 6 de novembro de 2008