domingo, 7 de fevereiro de 2010

+ um ferréz

imagem do bicho pegando no haiti e um mês depois da tragedia quem está no paredão do bbb?

Os carros pretos chegam.
Homens mascarados com rostos aparentes, com armas e coletes.
A polícia pisa no lixo, passa pelo córrego, corre pelas vielas, avança pelos barracos, patenteia o espetáculo.
Também acessível para quem quiser ver em um jogo de Playstation.
Ao vivo, ao vivo, chama o moto link!
Se fosse em São Paulo, seria só na hora do programa do Datena, o efetivo da policia só trabalha nesse horário.
Mas é Rio e é 40 graus.
Corpos magros, sem camisa, descalços, não vão abastecer a mercadoria do turista, não vão aliviar a tensão do empresário, não vão fazer rir o futuro arquiteto, não vão deixar mais alegre a festa de formatura, hoje não, hoje eles correm, e enquanto correm pensam em ter artigos da Ecko.
Mulheres correm, crianças andam, balas passam, lojas fecham e fazem o balanço do que vão deixar de ganhar.
O espetáculo continua, alguns colocam vendas para não ver, outros olham para o mar, outros criam taxas e mais impostos para um dia se mandar.
Entulho, madeira queimada, pneus, carros velhos, fumaça, pipas no céu, ameaças, laquê e canetas Mont Blanc.
Há alguns meses um jovem corria de um helicóptero, da TV Sony todo mundo assistiu almoçando, como se fosse às olimpíadas... do Faustão.
Tiros, o jovem preto-pobre-traficante caiu. Palmas! Está salvo o Brasil. No outro dia o assunto era o clima.
Arruda e seus milhões não dão ibope, não parece filme do Rambo.
O desbarrancamento, as mortes, não é culpa do estado rico, é culpa dos moradores, que deixam os esgotos caírem nos morros.
O povo é culpado.
Você já viu como andam quentes esses dias, Lia?
Claro, Alfonso, está infernal.
O repórter formado na FAAP não vai mais aproveitar a carona no helicóptero da polícia.
A emissora que pertence à LIFE não vai sobrevoar aquele amontoado de tijolos vermelhos vendidos no Armazém Gonsales.
As Casas Bahia não vão subir o morro, a Marabraz e seus relógios do Zezé de Camargo e Luciano não vão mais abrir uma filial ali.
Tudo isso não será mais feito, pelo menos até as armas, entre elas a Uzzy, serem recolhidas, potentes armas, potentes empresas que sabem distribuir no terceiro mundo, segundo em vendas de cosméticos e primeiro colocado no ranking internacional de combate à fome.
Agora a preocupação são as armas, nem pessoas, nem moradores, nem viciados, nem inocentes consumidores que tanto nutrem tudo isso.
O perigo são as armas.
Indignada, pisando na lama, em volta da fumaça, num calor infernal, com cheiro de pólvora e suor no ar, rodeada por menores e não meninos, por “supostos” bandidos e não por moradores, a repórter com sobrancelha definitiva, vestindo Gucci esbraveja:
– O que está acontecendo, por que estão fazendo isso com o Rio de Janeiro, o que há de errado?

Ferréz é escritor e hoje vive com a esposa e uma filha num país chamado periferia.

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